7.1.10

Estive pensando...

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Não sou atriz, modelo, dançarina
O meu buraco é mais em cima*
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.....Música genialmente escrita por Rita Lee, brilhantemente interpretada por Maria Rita. Pagu é uma das minhas músicas preferidas. Admiro a sonoridade, mas é a letra que me fascina. Aprecio a forma como Rita Lee conseguiu abordar temas sérios apenas com analogias, sem citá-los diretamente.
.....Vou comentar alguns trechos. Se preferir, conheça a música indo direto para a seção Intrigante Sinfonia (clicando aqui) e depois volte para cá.
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Intolerância pelo diferente
.....Logo no início da letra, na minha interpretação, quando a autora diz que “mexe e remexe na inquisição”, afirma que brinca com os padrões impostos pela sociedade. São pessoas como ela que, quebrando normas, fazem com que a inquisição continue funcionando. No verso “Só quem já morreu na fogueira sabe o que é ser carvão”, acredito que há uma referência à dor que é ser acusada por alguma característica ou atitude própria que não está necessariamente errada, porém, não corresponde ao que determinada sociedade espera: que todos sigam um padrão, que todos sejam iguais.

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Quebra de estereótipos
.....Na terceira estrofe [“Porque nem toda feiticeira é corcunda / nem toda brasileira é bunda (…)”], ela critica os estereótipos. Quem disse que toda feiticeira é feia, corcunda e má? Quem disse que toda brasileira é apenas um corpo bonito? Com estes versos afirma que há mulheres que não merecem ser julgadas . Após isso, apresenta-se como uma mulher diferente de muitas [“meu peito não é de silicone”] e defende que ser mulher não significa ser frágil. “Sou mais macho que muito homem”.
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Quero ser Pagu
.....Na quinta estrofe, eu me delicio com a breve, porém muito significativa, citação de Pagu. Pseudônimo de Patrícia Rehder Galvão, jornalista e escritora brasileira. Pagu foi um símbolo da sua época. Desde jovem, tinha os pensamentos avançados para os padrões do seu tempo e, por isso, quebrava paradigmas e criava polêmica. Sofreu preconceito com o seu jeito de ser. Porém, a verdade é que foi uma das personagens mais geniais da nossa história brasileira. Envolvida também com a literatura e a arte, sua maior obra foi sua história de vida. [Conheça mais clicando aqui].
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Nível elevado de existência
.....Quase ao final da música, está o meu trecho preferido. “Não sou atriz, modelo, dançarina / o meu buraco é mais em cima”. Vivemos, e não há pouco tempo, em uma sociedade em que profissões como atriz, modelo, dançarina e outras semelhantes são muito valorizadas.
.....Não me entendam mal. Não quero aqui desvalorizar essas expressões da arte. O que defendo é que há outras formas de “arte” que muito tem a nos agregar. Essa arte é o trabalho de Pagu, como já citado. Essa arte são as composições de Rita Lee, que muito nos ensinam sobre diversos assuntos (vida, amor, relacionamentos, sociedade, preconceito etc). Essa arte, muito edificante, só é possível no âmbito das ideias.


“O meu buraco é bem mais em cima”
.....Eu ficaria horas comentando cada verso desta música. Mas acredito que os leitores que conseguiram persistir bravamente até esta última linha já devam estar ansiosos para ouvir a música comentada. Então, BOM PROVEITO!
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*trecho da música Pagu, de Rita Lee

'Grafite Rita Lee em muro da Urca' (Henrique Padke)
Patinhos (
Fabiano Santiago)
Camiseta Esterótipos (Blog Estereótipo)
'Amo Livros', por Ana Magda.

6 comentários:

Fábio Pereira disse...

Pagu foi exemplar para as mulheres e, também, para os jornalistas.

Ir contra as convenções de nossa época é muito difícil.

Parabéns pelo texto, Srta. Ineffável.

FP

Unknown disse...

Sabe que a primeira frase da música que marcou e eu decorei assim que eu ouvi? “Só quem já morreu na fogueira sabe o que é ser carvão”, me identifiquei e muito, convivo como pessoas que não sabem, não fazem idéia do que é sacrifícios... bom,a musica é incrível na voz de ambas cantoras, mas confesso que amo a Rita Lee, ela está quantos anos a frente do tempo?50?Sei lá... a quantos anos escreveu uma letra essa música? Naquela época não existia BBB, não existia Sabrinas Satos, não existiam "mulher melancia"...as mulheres daquela época não eram nem um terço desvalorizadas (se desvalorizavam) como é hoje e Rita Lee ja dizia:
“meu peito não é de silicone”... Não sou atriz, modelo, dançarina / o meu buraco é mais em cima”.
Análise perfeita Fábia, amei, sua leitura da canção é perfeita.
Beijo!

Alisson Freitas disse...

Eu odeio a Rita Lee, mas essa música tem uma letra interessante, por ser uma homenagem a Pagu.

Bjo Fá

MaFê disse...

Admito não ser fã da Rita Lee, mas também admito que algumas letras dela são muito boas, e éssa é uma delas!!

Detesto estereotipos e pessoas que julguem as pessoas pelo que elas parecem ser sem realmente saber o que elas são!

Eu nunca tinha parado pra analisar de verdade as letras dela e a sua analise foi muito legal, parabens!!!

Beijos =*

Keila disse...

Tenho um amigo que é fanático pela Pagu, e graças à ele, me encantei com ela e suas 23 prisões, e incrível que mesmo assim, não perde a delicadeza feminina, mesmo sendo mais macho que muito homem.

Anônimo disse...

“Não sou atriz, modelo, dançarina" ela quis se referir que a personagem da música - Pagu - trabalha com o intelectual (ela era escritora, entre outros) e não julgar essas profissões, a própria Rita Lee já trabalhou no programa saia justa. As outras músicas que Rita Lee escreveu homenageando mulheres foram para Luz del Fuego (dançarina), Elvira Pagã (atriz e dançarina) e Leila Diniz (atriz). Danças e atuar também requer inteligência! Física, emocional e as vezes intelectual.